O Paganismo é um estado mental e governamental que vai da gema à árvore silvestre.
Sua fórmula é: Primo mihi et sequere naturam. Sempre é sintomático, não de uma evolução, mas de uma revolução. Vem de uma instrução corrompida, fruto de uma educação viciosa. Uma é como a outra, como o possuir e o ser, e ser corrupto, seja por si mesmo ou seja por seu intermédio, corrompe tudo até mesmo o verdadeiro possuir, principalmente o falso.
Seu caráter é ser filosófico e político, anti-religioso e anti-social. É filosófico e anti-religioso porque subordina a razão universal à individual, a dois critérios: objetivo da primeira, e subjetivo da segunda. É político e anti-social porque essa subversão do entendimento provém da suplantação da vontade, e porque tende a tomar por todos os meios a Legalidade para fazer oposição à Legitimidade.
Suas crises históricas são periódicas, crônicas em sua causa ontológica, e esse estado mórbido é natural ao espírito humano decaído, privado de seus dois verdadeiros critérios: a ciência e a Vida, que estudaremos mais adiante.
Ousou levantar seu próprio sistema de Filomania,[1] com o nome de Filosofia ou até mesmo de Teosofia; sua essência é a anarquia, e esta é: Fiat voluntas mea! É a vontade do homem. Fazer disso um princípio e colocá-lo numa balança com um ou muitos derivados da palavra Providência e Destino é não reconhecer princípio algum. É como criar três deuses, dos quais dois ficam sobrando, e essa é, realmente, a essência intelectual do Paganismo, tendo o politeísmo como o grau mais alto.
Fabre d’Olivet, sobre o qual voltaremos a falar depois, seguindo outros autores, atribuiu esta doutrina a Pitágoras, porém essa nunca foi a doutrina desse grande homem. Ele conhecia bem a fundo a Trimurti,[2] pela qual, sob diversos nomes, na Índia, na Caldéia, no Egito, haviam substituído Krishna à Trindade Patriarcal da Proto-síntese referida por São João.
Independentemente da concessão que o fundador do Brahmanismo atual tenha querido fazer, cinco mil anos atrás, ao estado mental dos letrados sudras, nunca pretendeu dizer que Brahma, Shiva e Vishnu não fossem outra coisa que a personalização dos três Poderes de um só e mesmo Deus Criador, Transformador e Conservador, e essa mesma Tríade não é mais do que a inversão desejada da Trindade anterior, que descuide desde o princípio eterno até a origem temporal das Hierarquias Criadoras,[3] dos seres e das coisas; do Universo Divino ao Universo Astral; da Biologia para a Fisiologia; do mundo das espécies para o embriogenia dos indivíduos; da involução para a evolução.
A mentalidade desta terceira casta usurpadora, dos sete sudras, correspondia apenas ao ensino primário antigo e a uns poucos fragmentos do secundário. Sua ganância homicida tinha invadido e aniquilado o Estado social das duas penínsulas, suas metrópoles contemporâneas de Nínive e da Babilônia, a Aliança Templária dos eslavo-arianos, argianos, aqueus e dos pelasgos indianos reconstituída por Orfeu, o Ribhou dos Vedas. Eles tinham fechado seus sentidos correspondentes aos graus superiores da Revelação, tanto no Direito religioso como na Ontologia.
Com raras exceções iriam expiar, de metrópole em metrópole, o preço das mais rudes provações, suas anatematizadas origens de yavanas, de mlechtas, de pinkshas, de Sudras e de revolucionários hyksos.
Foi isso o que Pitágoras fez durante mais de vinte anos, outros dizem que são quarenta. O postulante era admitido, depois de todas as purificações físicas, morais, intelectuais e espirituais, aos corpos eruditos religiosos, mantendo-o por um longo período de observação antes de reabrir nele os sentidos íntimos da graça e da vida superior. Na maioria dos casos, eles somente revelariam isso aos internos.
Quanto à massa instruída, degenerada do Verbo Órfico dentro de sua própria verbosidade, estava mais longe da Verdade, que é a Vida, que seus últimos escravos. E assim que nunca viram na sua Filosofia mais que sua própria Filomania de desafio, de casuística, de uma dialética sem fim, de uma anarquia mental e governamental. E, apesar de tudo, essa plebe intelectual se transformou na classe dirigente, permanecendo sempre curiosa, ao mesmo tempo que profanadora da perdida Sofia.
De Pitágoras a Hiérocles se estende todo um horizonte entre os estudos greco-latinos secundários e os superiores, onze séculos se passam contra sessenta, que contam a História melhor documentada de nossa humanidade terrestre, já que ela, exceto nos Livros sagrados, não ultrapassa seis mil anos.
Faz quatro séculos que este Paganismo milenar a favor da escravidão, da burguesia anti-social, é o único que impera na mentalidade da população e dos dirigentes governamentais, bem como em todas as Universidades européias, tanto sacerdotais como laicas.
Tanto o Clero como a Instrução, cuja diferença trataremos em outra ocasião, usam o mesmo clichê da anarquia em tantos livros quantos são os educandos. Estes, por sua vez, consentem em tudo: arte e vida, ciência, legislação, política e costumes. Mas, quanto mais longe vamos, mais diminui o modelo da imitação, estéril e mortal, do gênio cristão da nossa raça nesta era.
Cada pessoa instruída, alfabetizada dessa forma, desde o príncipe herdeiro de um trono até o último bolsista que estuda nos seminários ou nos liceus, recebem a mesma instrução vulgar, fruto da mesma mentalidade banalizada. A educação difere um pouco nas casas onde o verdadeiro espírito cristão está mais arraigado. Mas essa possibilidade é cada vez mais rara, podemos dizer que é até mesmo uma exceção, principalmente em razão da discrepância das fortunas, da erradicação das existências, da anarquia econômica, fruto desse sistema clássico, incapaz de governar o mundo que procura governar. Em todo caso, a instrução e a educação religiosa são limitadas para todos, indistintamente, à pura e simples catequização.
Colocando-se esses fatos numa balança, eles nos mostram que pendem a favor do Paganismo, com uma enorme diminuição em detrimento do Cristianismo. É então a demagogia intelectual dos pagãos, fracamente temperada com uma pitada de Cristianismo, que predomina tanto nos tronos europeus como em todas as cátedras de instrução, incluindo os elevados estudos das religiões comparadas, ponto culminante dessa anarquia.
Não é necessário ser um grande clérigo para ver como resultado que a luz dos mistérios do Pai e do Espírito Santo está totalmente ausente, desde os mais baixos aos mais elevados escalões dessas hierarquias laicas. Ao mesmo tempo, a luz contida nos mistérios do Filho, pontífice e Rei do Universo, Verbo Criador, Encarnado, Ressuscitado e Glorificado, é completamente obscurecida por esse Paganismo mental e governamental.
Porém, a Instrução foi feita para a vida, e não o contrário. Da mesma forma, a lei foi feita para o homem, e não o homem para a lei, de acordo com as palavras de São Paulo.
O método do Verbo é sempre aquele que formula em todas as coisas da vida, e se trata aqui da vida social. A educação prima, pois, sobre a instrução, porque a primeira aponta ao ser e segunda ao ter. Uma é essencial, a outra é auxiliar. Mas o caráter do espírito clássico é o de substituir com suas tagarelices ao Verbo e suplantar o espiritual para usurpar o temporal. Quer ser ao mesmo tempo a razão que ensina e a razão de Estado, cabeça e braços seculares. É, pois, exclusivo da educação, porque a imitação política dos pagãos é exclusiva do ser, e não leva mais a uma possessão demoníaca.
Podemos possuir bilhões e não sermos nada. A pessoa pode não ter nada e ser de um valor incalculável. Assim, o valor da instrução depende do erro que se faz dela, como a fortuna, o talento e a beleza.
A criança é uma página em branco, sobre a qual podemos escrever tudo, sobre o céu ou sobre o Inferno. É uma pequena e querida arvorezinha silvestre humana, na qual podem ser enxertadas todas as flores das árvores do Paraíso. À sua direita, existe um Anjo de Luz invisível, mas, à esquerda, há um Demônio preto. O Anjo contribui com os sete dons que irradiam do Espírito Santo Universal; o Demônio contribui com os sete dons tenebrosos do auto-espírito individual.
Trecho retirado do livro O Arqueômetro de Saint-Yves d’Alveydre