Vocês conhecem a Bel Pesce? Pois bem, acredito que a maioria só passou a conhecê-la depois do Zebeleo, um crowfunding de uma hamburgueria totalmente inovadora. E acreditem, não é porque que vende hambúrgueres feitos de 2 carnes e um pão no meio, o motivo é o conceito por trás de um produto gourmet que você encontra em qualquer feira gastronômica. Por ela, o tal Zé e o Leo ganhador do Master Chef terem dinheiro suficiente para não pedirem dinheiro a gente, a empreitada virou uma piada, justa, alias. Ao mesmo tempo em que apareceu um ódio e um desentendimento do porque da fama da menina, que aparentemente mente no currículo dela, me criou curiosidade para saber mais dela (através de textos, inclusive ela tem uma conta no Medium).
O discurso dela é muito parecido com uma porção de gente que venceu na vida: Queria deixar seu emprego de gerente máxima numa multinacional fodona, pegou alguns dinheiros, foi pro EUA, fez estágio em um monte de lugar, de tão boa foi chamada para mais lugares, hoje ganha dinheiro fazendo algo que pô, porque não pensei nisso antes. Já ouvi dela, da nova chef do Hells Kitchen (que disse que precisava mudar de emprego insatisfatório, pegou 500 dólares e foi para a França.), das pessoas ao meu redor, dos grandes empresários, nos textos da geração que é preguiçosa e não está rica porque não quer. Normalmente são pessoas bem nascidas, com pais bancando viagem para a Europa e curso em faculdades caras, tinham um trabalho chato, mas como é a geração que podem fazer o que quiser, fazem o que querem.
Eu às vezes, talvez num momento como o meu de agora, sou seduzida por este discurso. Olho pro meu lado e vejo gente na glória da flor da idade. Com 20 e poucos anos, morando sozinhos, sendo chamados para projetos a rodo, sendo respeitados, casados, felizes, realizados. Trabalhando onde querem, ganhando bem o suficiente para não pensarem em quão 20 reais fazem falta, com o parceiro perfeito em fotos incríveis no Instagram. Olho para meu umbigo e vejo uma artista falida no auge da depressão, querendo não fazer nada, não vendo nenhum projeto emplacar porque precisar fazer isso sozinha, sem dinheiro e nenhum namorado para passar os dias de frio (até tenho alguém, mas é aquele ser que vivo postando texto sobre ele). Eu sou um fracasso. Eles, vencedores.
Acontece que não sou a única e não me surpreenderia se alguém chegasse até a mim e falasse que sente o mesmo. Vejo amigos batalhando sem sair do lugar, sonhando com o dia que vão poder ficar tranquilos em relação as contas do mês. Gente na depressão, de tentar fazer algumas coisas mas não conseguir porque não ver retorno. Gente com mais de 25 morando com os pais porque não tem como se sustentar sozinho. Gente tomando remédio, com corações quebrados e esperando o dia passar para a noite chegar e poder dormir em paz. Ora, o que a gente está fazendo de errado para ficar assim? Então, nada.
A galera está tão louca para denominar a tal geração de 20epoucos quase 30 que tem empresas cedo, que são pessoas livres e viajam por lugares maravilhosos largando tudo para virar hippie no Chile que se esquecem que uma história não é igual a todas as outras. Vamos lá, quem pode largar um trabalho que ganha bem para ser feliz, sem pensar em contas ou na creche do filho, já são privilegiados. Eu não posso fazer isso e acredito que nem você. É trabalhar num lugar onde te deixa mal, que você espera reconhecimento mas nunca irá aparecer, ganhar pouco mas ficar feliz por ter algo. A maioria suporta esta pressão para ter o que comer e sustentar algum sonho, que talvez nem se concretize em vida. Quantas pessoas trabalham num lugar insatisfatório e não podem sair deste ciclo que parece não ter fim?
A minha geração é a geração que precisa pagar as contas antes de tudo. Nos espelhamos em textos de como ser melhores sem a possibilidade de ser. Temos outras prioridades e isso vai crescendo de uma forma que assustadoramente talvez não saímos dessa. Estamos num país que nem todo mundo tem faculdade e nem pode fazer. Que a maioria sobrevive com um salário mínimo, que nem pode pensar em comprar um requeijão porque no mercado custa 10 reais. Somos uma geração como a música Maria Maria, do Milton Nascimento: Não vivemos, apenas aguentamos.
E se mais alguém vier com o discurso de “precisamos nos esforçarem mais” vai levar um belo pontapé no meio da cara. Vocês simplesmente não sabem o que estão falando.
Texto original: Bia Quadros